quarta-feira, 30 de abril de 2008
Pedra Filosofal
segunda-feira, 28 de abril de 2008
I Encontro do Luso-poemas
quarta-feira, 23 de abril de 2008
Aprendi
Aprendi que eu não posso exigir o amor de ninguém, apenas posso dar boas razões para que gostem de mim e ter paciência, para que a vida faça o resto.
Aprendi que não importa o quanto certas coisas sejam importantes para mim, há pessoas que não ligam... e eu jamais conseguirei convencê-las.
Aprendi que posso passar anos construindo uma verdade e destruí-la em apenas alguns segundos. Que posso usar meu charme apenas por quinze minutos porque, depois disso, preciso saber do que estou a falar.
Eu aprendi... que posso fazer algo num minuto e ter que responder por isso o resto da vida. Que por mais que se corte um pão em fatias, esse pão continua tendo duas faces, e o mesmo vale para tudo o que cortamos em nosso caminho.
Aprendi... que vai demorar muito para me transformar na pessoa que quero ser, e devo ter paciência. Mas aprendi também que posso ir para além dos limites que eu próprio coloquei.
Aprendi que preciso escolher entre controlar meus pensamentos ou ser controlado por eles. Que heróis são pessoas que fazem o que acham que devem fazer naquele momento, independentemente do medo que sentem.
Aprendi que perdoar exige muita prática. Que há muita gente que gosta de mim, mas não consegue expressar isso.
Aprendi... que nos momentos mais difíceis a ajuda veio justamente daquela pessoa que eu achava que iria tentar piorar as coisas.
Aprendi que posso ficar furioso, tenho direito de me irritar, mas não tenho o direito de ser cruel. Que jamais posso dizer a uma criança que seus sonhos são impossíveis, porque seria uma tragédia para o mundo se eu conseguisse convencê-la disso.
Eu aprendi que o meu melhor amigo me vai magoar de vez em quando, que eu tenho que me acostumar com isso. Que não é o suficiente ser perdoado pelos outros, eu preciso me perdoar primeiro.
Aprendi que, não importa o quanto o meu coração esteja sofrendo, o mundo não vai parar por causa disso.
Eu aprendi... que as circunstâncias de minha infância são responsáveis pelo que eu sou, mas não pelas escolhas que eu faço enquanto adulto.
Aprendi que, numa briga, eu preciso escolher de que lado estou, mesmo quando não quero me envolver. Que, quando duas pessoas discutem, não significa que elas se odeiem; e quando duas pessoas não discutem não significa que elas se amem.
Aprendi que por mais que eu queira proteger as pessoas que amo, elas se vão magoar e eu também. Isso faz parte da vida.
Aprendi que a minha existência pode mudar para sempre, em poucas horas, por causa de pessoas que nunca vi antes.
Aprendi também que diplomas na parede não me fazem mais respeitável ou mais sábio.
Aprendi que as palavras de amor perdem o sentido, quando usadas sem critério. E que amigos não são apenas para guardar no fundo do peito, mas para mostrar que são amigos.
Aprendi que certas pessoas vão embora da nossa vida de qualquer maneira, mesmo que desejemos retê-las para sempre.
Aprendi, afinal, que é difícil traçar uma linha entre ser gentil, não ferir as pessoas, e saber lutar pelas coisas em que acredito.
Texto atribuído a William Shakespeare. Oxalá todos aprendam mais um pouco com ele.
domingo, 20 de abril de 2008
Tu és a minha estrela
Embalo nas vagas,
Que alimentam o meu corpo…
E transporto em mim,
Os segredos escondidos no tempo.
No refúgio dos sentimentos,
Que despertam na imensidão…
Apelos que deslizam em ecos,
Erguidos nos gestos do coração.
Resvalo suavemente no teu dorso,
Na nudez que partilhamos no infinito,
Palavras de desejos proibidos…
De tantos sonhos construídos.
Na crista da espuma de algodão,
Feita de ondas que alimentam o meu peito,
Escorrem na praia deserta…
Os filamentos escritos na areia,
Perpetuam palavras do poeta.
Acendem à noite as estrelas no céu,
Diamantes que pintam a luz que irradia,
Nada será hoje como dantes…
Porque em mim uma outra estrela brilha.
Apenas sei que no silêncio que me percorre,
No abraço que te dou em meu manto azul,
O perfume do teu ser que embalo,
Refúgio que acolhes no meu corpo.
Sopra o vento …
Sintonia do pensamento que vagueia no ar,
Nada mais importa,
Nada mais…
Eu sou o mar…
E tu… a minha estrela marinha.
um excelente poema de Luís F., quiçá um dos melhores dele.
sexta-feira, 18 de abril de 2008
Solidariedade e compaixão
Estes dois sentimentos nos devolvem nossa humanidade perdida (ou não) num mundo dito exclusivo de interesses terrenos e alheio à dor do outro. Acima de tudo, a solidariedade e a compaixão nos colocam perto desta Força, que nos interliga e nos aproxima à medida que podemos ver que a dor do outro não é menor que a nossa, à medida que nos identificamos com o sofrimento do próximo e de alguma forma, desejamos minimizá-lo. Isto chama-se amor consciente e desinteressado, isto é vontade de fazer o bem.
Quando somos solidários e compassivos, a dor do outro é a nossa. Nos indignamos se o próximo se indignar, sofremos se ele sofrer, tentamos ser alento e damos a mão, o ombro amigo, palavras consoladoras e até choramos juntos.
São nos momentos difíceis que encontramos estas almas e elas nos aparecem sob diversas formas: pode ser aquele olhar que se condói por ti, podem ser pessoas que se indignam contigo, ou mesmo que dizem “ vou orar por ti” e ainda há aquelas que abrem as bolsas e te dão fotos de santos para te ajudar e proteger.
Sim, estes anjos sem asas estão por ai, existem de verdade e eu os encontrei nesta semana de desafios e luta.
Nunca acreditei na total desumanização do ser humano que, grotescamente, massacra e é massacrado pelo sistema vigente. Nunca acreditei num mundo esmagado pela estupidez e pela hipocrisia. Nunca pensei como Camus que disse ser a existência humana algo ininteligível, que via o homem como um ser que se afundava em uma rotina confortável que lhe dava a ilusão de ter algum valor e, se enganava de que não estava só. E, agora, acredito menos ainda. A solidariedade e a compaixão são as pontes que nos libertam da solidão.
Tenho esperança na força renovadora do bem, tenho esperanças no amor, tenho esperanças no ser humano e na sua incrível capacidade de atos grandiosos e sentimentos nobres.
Gabriela Mistral está tão certa. Sim, somos seres frágeis, mas somos fortes ainda em nosso poder de compartilhar os nossos corações e de amar o próximo como a nós mesmos.
Karla Bardanza
Se você mora no Rio de Janeiro, DOE SANGUE. Para cada pessoa com dengue hemorrágica são necessárias 7 bolsas de sangue. Faça sua parte. Doe sua Luz.
Conheçam mais da Karla e dos seus lindos textos em http://kbardanza.zip.net/
quarta-feira, 16 de abril de 2008
Encontrei um tesouro
Quem me conhece sabe que gosto de falar (até demais, ás vezes), que adoro estar com os amigos e que conviver com outras pessoas é quase que a minha segunda pele. Nesta fase era o oposto de mim.
Foi uma fase complicada. O meu mau estar levava-me a não ser eu nas minhas atitudes. E o facto de não conseguir ser eu nas minhas atitudes levava-me a estar mal. Um círculo vicioso, do qual não conseguia sair. Não interessa agora saber o motivo. Ficou perdido no tempo. Fugiu-me.
Foi na faculdade que encontrei um tesouro. Um não, vários. Pessoas que me conheceram nessa altura má e que, apesar de me conhecerem há pouco tempo, não abriram mão de mim. Tiveram a força suficiente para, aos poucos, começarem a penetrar no mundo fechado em que eu vivia. Forçaram-me a sair com eles. A conviver, a estar com pessoas. Nos primeiros tempos eu tentava fugir. Não queria ir. Arranjava desculpas esfarrapadas para não ir. Mas não desistiram. Aos poucos deixei de ter desculpas e comecei a ter de ir. E que bem que me soube voltar a estar com pessoas – mesmo que, nos primeiros tempos, não o assumisse.
Graças a esses tesouros que encontrei, a esses amigos que não desistiram de mim, voltei a sorrir, voltei a rir e voltei a encarar a vida com optimismo – em suma, voltei a ser eu. Com eles reaprendi que a amizade é fundamental e que não devemos desistir dos amigos – mesmo que eles queiram que o façamos.
Quando os nossos amigos cedem às pressões, quando renunciam de si, dos outros, dos seus sonhos, a verdadeira amizade está em ajudá-los a reencontrarem-se.
terça-feira, 15 de abril de 2008
Amigo Aprendiz
Quero ser teu amigo,
Nem demais e nem de menos...
Nem tão longe e nem tão perto.
Na medida mais precisa que eu puder.
Mas amar-te como próximo, sem medida...
E ficar sempre em tua vida
Da maneira mais discreta que eu souber.
Sem tirar-te a liberdade,
Sem jamais te sufocar,
Sem forçar a tua vontade.
Sem falar quando for a hora de calar.
E sem calar quando for a hora de falar.
Nem ausente nem presente por demais...
Simplesmente, calmamente, ser-te paz.
É bonito ser amigo, mas confesso:
É tão difícil aprender...
Por isso, eu te peço paciência.
Vou encher este teu rosto
De alegrias, lembranças...
Dê-me tempo
De acertar nossas distâncias!
Poema de Fernando Pessoa que dedico aos meus amigos
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Saudade
Pode-se descrever como uma melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou acções, um desejo de rever ou possuir um bem especial.
Existe ainda uma outra lenda que diz que, por ser uma única palavra a definir uma mistura de sentimentos, é intraduzível. Aliás, para confirmar esta lenda, foi feita recentemente uma pesquisa entre tradutores britânicos que a considerou como a sétima mais difícil de traduzir.
No entanto há excepções a esta regra. Na língua romena, a palavra "dor” (a dor portuguesa traduz-se por “durere”). Em galego existem várias variantes, sendo que também é usada a palavra saudade (as variantes são soidade, morriña ou morrinha, estas duas últimas com um significado parcialmente coincidente). Em crioulo cabo-verdiano existe a palavra sodade ou sodadi.
Sabem, eu acho que a saudade não se define, sente-se. É saudade o que sinto quando me lembro do meu avô, que morreu há cinco anos e que me deixou um vazio no coração que ninguém consegue preencher. É saudade que sinto quando olho para o filho dum amigo que morreu de acidente de mota há seis anos… ou quando vou a casa da minha sogra e o meu sogro não está lá para nos receber.
Saudade é quando me lembro de amigos com quem não falo há bastante tempo, quando determinados cheiros me trazem à memória as minhas recordações de infância. Como é que posso definir, senão com a palavra saudade, o que sinto quando me lembro do tempo em que estava nos escuteiros, das nossas actividades, dos sábados que passávamos juntos e onde nasceram amizades que ainda hoje se mantêm?
Todos sentimos saudades de quando brincávamos na rua e os nossos pais podiam estar descansados que o pior que nos podia acontecer era magoar um joelho ou partir a cabeça.
E não será saudade o que um pai sente porque só pode estar com a filha que ama em alguns fins-de-semana, porque ela vive com a mãe noutra cidade?
Os meus filhos, ainda pequenos, já me perguntam o que é a saudade… Ouviram esta palavra e quiseram que eu a explicasse. Não consegui. Sei que um dia eles vão sentir saudades, e ai sim, vão perceber o que é. Mesmo que não a definam.
sábado, 12 de abril de 2008
Suicídio
Talvez pela associação do arco-íris à lenda (ou realidade?) da arca de Noé. Lembram-se? Depois de terminado o dilúvio, surge no céu um arco-íris como sinal de que nunca mais Deus destruiria a terra. Sinto-me sempre reconfortada quando os vejo. O dia corre bem, de certeza...
Certo é que até foi um dia como os outros. Nada de extraordinariamente positivo aconteceu. Até aqui tudo bem, também não esperava ganhar o euromilhões lá porque tinha visto o arco-íris (bem, até porque, para isso era preciso que tivesse jogado).
Ao fim do dia, e tal como estava agendada, lá fui a uma reunião. No decorrer da reunião o senhor com quem estava reunida recebeu uma chamada. Acabou por atender (pedindo-me as devidas desculpas) e... bem, aqui o meu dia descambou. Porque o telefonema era para avisar o senhor que tinham acabado de encontrar o pai dele enforcado na cave. Como podem imaginar a reunião acabou de imediato... e eu, que até julgava que o dia me ia correr bem, acabei-o com uma enorme sensação de vazio.
O que levará uma pessoa a cometer suicídio? Será cobardia? Será que a pessoa se sente incapaz de ultrapassar os problemas que tem ou pensa ter? Será que há alguma razão válida para cometer suicídio? Que será tão grave que leve uma pessoa a quer deixar de estar com os seus entes queridos, deixar de sentir o vento na cara, o cheiro das flores, ouvir o riso duma criança? Não será cobardia não enfrentar os problemas, não os tentar resolver?
Será coragem? Não será preciso coragem para tomar uma atitude destas? Saber o exacto momento da morte, preparar a morte e, quiçá, vê-la chegar? Não será preciso coragem para meter uma corda pendurada no tecto e depois subir a um banco, meter o pescoço lá dentro e dar um pontapé no banco? Atirar-se duma ponte ou para a frente dum comboio?
Acima de tudo acho que são pessoas desesperadas. Que acham que a vida já lhes deu tudo e que nada mais esperam senão sofrimento. Que não tem apoio suficiente das suas famílias (ou que acham que não têm). Que são doentes, na maior parte das vezes, e que, por descuido e falta de tempo, os que lhes são próximos não se apercebem...
São inúmeras as razões para o suicídio. Para mim, nenhuma é válida. Amo a vida tal qual ela é. Cheia de espinhos. Porque são os momentos mais espinhosos que me levam a saber apreciar os momentos mais belos. Não fora ter problemas, como saberia eu o que é não os ter? Gosto de sentir a chuva, de ter frio, de cheirar as flores, de brincar com os meus filhos, de estar com os amigos, de ter fome e de a saciar a seguir... tudo, os bons e os maus momentos. Gosto de todos os momentos. Gosto de viver e de me sentir viva.
(escrito a 11/04/2008)
quinta-feira, 10 de abril de 2008
Esta noite meu pai matou-me
Foto de Stefano Bandini
O meu nome é "Sara"
Tenho 3 anos
Os meus olhos estão inchados,
Não consigo ver.
Eu devo ser estúpida,
Eu devo ser má,
O que mais poderia pôr o meu pai em tal estado?
Eu gostaria de ser melhor,
Gostaria de ser menos feia.
Então, talvez a minha mãe me viesse sempre dar miminhos.
Eu não posso falar,
Eu não posso fazer asneiras,
Senão fico trancada todo o dia.
Quando eu acordo estou sozinha,
A casa está escura,
Os meus pais não estão em casa.
Quando a minha mãe chega,
Eu tento ser amável,
Senão eu talvez levaria
Uma chicotada à noite.
Não faças barulho!
Acabo de ouvir um carro,
O meu pai chega do bar do Carlos.
Ouço-o dizer palavrões.
Ele chama-me.
Eu aperto-me contra o muro.
Tento-me esconder dos seus olhos demoníacos.
Tenho tanto medo agora,
Começo a chorar.
Ele encontra-me a chorar,
Ele atira-me com palavras más,
Ele diz que a culpa é minha, que ele sofra no trabalho.
Ele esbofeteia-me e bate-me,
E berra comigo ainda mais,
Eu liberto-me finalmente e corro até à porta.
Ele já a trancou.
Eu enrolo-me toda em bola,
Ele agarra em mim e lança-me contra o muro.
Eu caio no chão com os meus ossos quase partidos,
E o meu dia contínua com horríveis palavras...
"Eu lamento muito!", eu grito
Mas já é tarde de mais
O seu rosto tornou-se num ódio inimaginável.
O mal e as feridas mais e mais,
"Meu Deus por favor, tenha piedade!
Faz com que isto acabe por favor!"
E finalmente ele pára, e vai para a porta,
Enquanto eu fico deitada,
Imóvel no chão.
O meu nome é "Sara"
Tenho 3 anos,
Esta noite o meu pai *matou-me*.
Este poema é de autor desconhecido. Gostaria que a dor que relata fosse também desconhecida das crianças que morrem diariamente vítimas de violência. E quantas vezes vítimas dos próprios progenitores que nada fazem para as proteger.
No link http://www.ad-awards.com/commercials/selection/institute_for_support_of_abused_children/commercials-218.html podem ver um filme sobre este tema que nunca passou na televisão e que é mais um alerta. E como diz um amigo meu, a realidade dói. E dói ainda mais porque há quem vire a cara, há quem saiba destas situações e nada faz.
Os animais não tratam as suas crias como alguns seres humanos o fazem. Para a Sara do poema, teria sido melhor ter um animal como pai. Se calhar estaria viva e os seus olhos mostrariam alegria em vez de estarem inchados.
Fica mais um alerta. Se calhar inócuo.
domingo, 6 de abril de 2008
Um recado
Só as estrelas me tocam
(escusas de tentar...)
Nas vagas do tempo que está para vir,
(ainda assim é preciso esperar...)
E na preciosidade das palavras secretas
(vejo o teu olhar escondido...)
Escondo-me e apago-me
(e também me escondo... fujo)
Sem mais gestos clandestinos
(nem desejos insurgidos)
E sem a avidez dos sentidos.
(desisto… de querer!)
O sal queima-me a pele
(de uma forma subtil)
E as letras a boca quente.
(alimentam-me o Ser.)
E lanço-me ao vazio vago da escuridão,
(na ânsia e na procura,)
Num sonho e num desejo,
(sem limitações do acessos)
Envoltos em liliáceas
(visto os pecados)
Com que me cubro
(e danço em fantasias)
E espero...
(melodias do acto)
Espero-te...
(achego…)
dueto entre Vera Silva e Paulo Afonso.
Sem dúvida, dois autores excelentes que mostram, neste poema, mais uma vez a sua qualidade. Um beijo aos dois
quinta-feira, 3 de abril de 2008
Poema de amor para uma mulher
Na janela aberta do teu peito
poisam os pássaros com fulgor
Em rubros lençóis de cama
a saudade pegou fogo à dor
essa que vive no leito
de quem sofre e ama
Vestiste-te de orvalho fino
cumprimentaste o dia-flor
No teu ventre de Mel puro
zumbiam as abelhas sem tino
à procura da memória do amor
Nomeaste as coisas para futuro
Terra, ar, fogo e água...
E do outro lado deste mundo
a saudade deixou de ser mágoa
a tem-te agora em meu peito fundo
Encontrei-te num canteiro
quando a tarde madura tombou
fui apicultor e jardineiro
de um beijo que alguém roubou
Este poema foi escrito pelo José Torres. Devem haver poucos autores como ele, uma vez que tanto escreve um fado em coisa de minutos, inspirado pela conversa do momento, crónicas, romances, contos, prosa, poesia….
É, seguramente, um dos autores de quem não perco de vista um único trabalho. E acreditem, deu-me uma trabalheira escolher o texto que aqui haveria de por. Escolhi este porque, segundo a explicação do José, é um poema de amor dedicado a todas as mulheres.
Visitem o blogue http://www.o-ente-do-ser.blogspot.com/ e vão conhecer mais sobre o José Torres e a sua escrita
quarta-feira, 2 de abril de 2008
Sentir
Sinto-me… feliz! Quando ouço o riso dos meus filhos, quando cheiro uma flor, quando ouço uma música especial…
Sinto-me… impotente! Quando vejo crianças a serem maltratadas, quando vejo pessoas a passar fome, quando vejo injustiças…
Sinto-me… a viajar! Quando leio uma boa história, quando olho para um quadro, quando vejo um filme…
Sinto-me… com raiva! Por ver mulheres a serem tratadas como objectos de decoração, a serem mutiladas, espancadas, e o mundo olha sem nada fazer…
Sinto-me… alegre! Quando estou com a família ou os amigos, quando me sento numa esplanada sem pressas…
Sinto-me… amargurada! Por haver medo em assumir o que se gosta, quando o que se gosta sai fora do que é aceite em sociedade, por haverem pessoas conflituosas…
Sinto-me… satisfeita! Quando acordo de manhã, quando vou trabalhar porque faço o que gosto… e gosto do que faço…
Sinto-me… triste! Por haver pessoas que não se sabem rir, que querem ser conhecidas a todo o custo, que querem chegar ao topo sem olhar aos meios para lá chegar, que não sabem partilhar…
Sinto-me… curiosa! Porque não conheço a cara e a voz de alguns amigos, uns porque vivem demasiado longe, outros que estão perto mas que nunca nos encontramos…
Sinto-me… afortunada! Por ter filhos, família, amigos que fazem com que a minha vida valha a pena…
Sinto-me… bem! Quando recebo cartas, e-mails, sms’s dos amigos, porque sei que se lembram de mim, como eu me lembro deles…
Sinto-me… preocupada! Quando as pessoas de quem gosto viajam, até ao momento em que sei que chegaram bem...
Sinto-me… útil! Quando ajudo os amigos, quando não os deixo desistir do que querem, quando os acompanho…
Sinto-me… gorda! Quando a roupa não me serve de manhã, quando me apetece comer um bolo de chocolate…
Sinto-me… eu! Esta sou eu. Sem mais. Sem menos. Uma pessoa como as outras, com defeitos, com virtudes, com coisas boas e com coisas más. Que se ri dos outros, porque primeiro se ri de si própria. Que assume o que pensa, sem medo de ser criticada, que odeia conflitos… eu. Apenas eu! E só eu! Entre a capa que me esconde e a verdade que mostra... neste meu sentir!
terça-feira, 1 de abril de 2008
Génesis
Aqui
onde quase todas as coisas adormecem
sem nunca terem sentido a força de teus braços
criei pastosas raízes
à terra
à rocha
ao íngreme acutilante da fraga
aos mais ínfimos espaços.
Sento-me na poeira fina libertada pó d’argila
p’lo talhe penetrante da charrua.
Mimo o corpo em residência primeira
na seiva d’erva azeda
póstuma sementeira golpeada p’la enxada.
Deixo que o cheiro doce da madrugada me possua
cada poro
cada camada dérmica
cada película tenra de alma
cada língua d’água libertada gota a gota em deriva.
Há aqui um tempo calmo, amado,
um tempo leve
espessado na frescura voluptuosa de um tule –
tão leve, tão táctil, tão brando -,
um afago azul inverosímil de tão terno
e o registo antigo
das tuas mãos depostas na concha púbica do prazer
a fiar
a cerzir
a tecer
em tear líquido de linho
um orgasmo
um gemido do mais divino bem-querer.
Aqui
onde quase todas as coisas adormecem
sem nunca terem sentido a força anímica de teus braços
há o encantamento reconhecido se provindo do silêncio genésico e uterino.
Este poema foi escrito pela Mel Carvalho, uma boa amiga, uma excelente pessoa de quem gosto bastante.
A Mel é muito versátil, tanto escreve poesia (como podem verificar no blogue http://noitedemel.blogs.sapo.pt/) como prosa (no blogue http://noitedemel.blogspot.com/). E sempre com qualidade.