Foto de Hamad Al-Naemi
Estou aqui sentada no sofá com uma sensação agonizante em mim, não sei para onde ir, não sei como ir, não sei o que fazer e preciso encontrar algo para fazer, sentir-me viva a fazer algo, preciso. Agito os pensamentos dentro da minha cabeça, o tempo passa e eu sem saber nada. Apetece-me chorar mas não choro com medo de magoar quem me rodeia, apetece-me correr até à casa de banho e engolir meia dúzia de medicamentos, esquecer o que mora em mim, enlouquecer só um bocadinho.
Quantas vezes me tentei matar? Quantas vezes me tentei esquecer? Perdi-lhes a conta.
Quero cortar-me de novo e sentir esta dor dentro de mim diminuir, quero desaparecer. Se perco o autocarro apetece-me morrer, se o céu está azul apetece-me viver, se alguém se chateia comigo apetece-me morrer, se alguém me dá um abraço apetece-me viver.
Se é para voltar para aquele lugar onde estava quando tomava medicamentos então deixem-me estar aqui na indecisão.
Quero fazer algo! Preciso.
Apetece-me correr para a casa de banho, pegar na lâmina e cortar-me só um pouquinho... olho o meu braço e penso em todas as vezes que me cortei, nas marcas que isso me deixou, na ideia suicida que habita em mim e em tudo o que me impede de o fazer.
Calo-me! Silencio-me! Mas há dentro de mim um mar de vozes misturadas que não consigo calar, mesmo que queira.
Esta noite não dormi, queria mas não consegui, lembrei-me imensas vezes da voz da psiquiatra: "sempre que não conseguir dormir tome um comprimido, não lhe fará mal" mas também me lembro que sempre que não conseguia dormir tomava um comprimido e não resultava, tomava outro e nada, outro e mais outro e ainda outro e nada, até que acordava numa cama de hospital e me acusavam de tentativa de suicídio. Prefiro ficar alerta, acordada a noite inteira sem pregar olho.
Tenho um nó na garganta que mal me deixa respirar, as minhas mãos tremem, no peito o coração não bate, salta. O que se passa comigo? Preciso de ir ao médico mas tenho medo de o fazer. A última vez que lá fui ela não me atendeu porque não podia, depois deixei de lá ir. Desistir de mim? Sim! Eu não presto. Se prestasse estava neste momento a estudar mas não consigo...
... há tanta coisa a mais dentro de mim.
Acho que vou à casa de banho, se me cortar só um bocadinho ninguém notará e dentro de mim calar-se-á algo.
Se vir sangue sinto-me viva.
Eu não sou normal!
O texto acima é da Margarete Silva. Quando publiquei a crónica sobre o suicídio, recebi o comentário abaixo da Margarete. Achei importante trazer-vos ambos, porque, em conjunto, definem, na primeira pessoa, o que sente alguém que sofre desta neurose. Por outro lado, esclarecem algumas das dúvidas que muita gente tem sobre as razões do suicídio.
Amiga Stone
O normal em mim é desejar a morte muitas vezes ao dia, só porque tenho uma neurose, neurose borderline, na verdade já tentei acabar comigo e por minutos não conseguia, nada me orgulha. Também não tenho o orgulho ferido por agora lhe dizer isto mas o seu texto tocou-me.
Estou sozinha em casa e dentro de mim uma dor revolta quase me levava a pegar numa caixa de medicamentos e me esconder a choro na casa de banho, sabe Deus para fazer o quê, mas a sua crónica prendeu-me.
Tenho um blog inteiramente dedicado à minha doença www.dancas-de-mim.blogspot.com, talvez através dele encontre alguma resposta para as suas perguntas, aviso-a de antemão que são complicadas respostas para complicadas perguntas.
Deixo-lhe um texto meu, um desses acordares para a vida a que eu chamo ressuscitar:
Deito-me na escuridão, não consigo dormir sozinha, não consigo dormir sem a presença de alguém, há sombras que me perseguem, há um mundo inteiro que eu não entendo a ocupar-me as veias, nos braços as feridas que fiz a mim própria e a vontade de nunca as ter feito, cicatrizes para uma vida inteira, saltei do meu mundo para entender o vosso como se fosse fácil de entender o que cedo nos custa a amar... Fiquei assim com a linha firme a servir-me de segurança, hei-de avançar ou recuar? Esta minha súbita maneira de forjar a realidade ao ponto de me reconhecer nela. Esta minha estúpida e insensata mas tão deliciosa como desequilibrada vontade de morrer às vezes, quando todos adormecem e eu não consigo fechar as pálpebras.
Um beijo e um obrigado por me ter prendido aqui.
Quantas vezes me tentei matar? Quantas vezes me tentei esquecer? Perdi-lhes a conta.
Quero cortar-me de novo e sentir esta dor dentro de mim diminuir, quero desaparecer. Se perco o autocarro apetece-me morrer, se o céu está azul apetece-me viver, se alguém se chateia comigo apetece-me morrer, se alguém me dá um abraço apetece-me viver.
Se é para voltar para aquele lugar onde estava quando tomava medicamentos então deixem-me estar aqui na indecisão.
Quero fazer algo! Preciso.
Apetece-me correr para a casa de banho, pegar na lâmina e cortar-me só um pouquinho... olho o meu braço e penso em todas as vezes que me cortei, nas marcas que isso me deixou, na ideia suicida que habita em mim e em tudo o que me impede de o fazer.
Calo-me! Silencio-me! Mas há dentro de mim um mar de vozes misturadas que não consigo calar, mesmo que queira.
Esta noite não dormi, queria mas não consegui, lembrei-me imensas vezes da voz da psiquiatra: "sempre que não conseguir dormir tome um comprimido, não lhe fará mal" mas também me lembro que sempre que não conseguia dormir tomava um comprimido e não resultava, tomava outro e nada, outro e mais outro e ainda outro e nada, até que acordava numa cama de hospital e me acusavam de tentativa de suicídio. Prefiro ficar alerta, acordada a noite inteira sem pregar olho.
Tenho um nó na garganta que mal me deixa respirar, as minhas mãos tremem, no peito o coração não bate, salta. O que se passa comigo? Preciso de ir ao médico mas tenho medo de o fazer. A última vez que lá fui ela não me atendeu porque não podia, depois deixei de lá ir. Desistir de mim? Sim! Eu não presto. Se prestasse estava neste momento a estudar mas não consigo...
... há tanta coisa a mais dentro de mim.
Acho que vou à casa de banho, se me cortar só um bocadinho ninguém notará e dentro de mim calar-se-á algo.
Se vir sangue sinto-me viva.
Eu não sou normal!
O texto acima é da Margarete Silva. Quando publiquei a crónica sobre o suicídio, recebi o comentário abaixo da Margarete. Achei importante trazer-vos ambos, porque, em conjunto, definem, na primeira pessoa, o que sente alguém que sofre desta neurose. Por outro lado, esclarecem algumas das dúvidas que muita gente tem sobre as razões do suicídio.
Amiga Stone
O normal em mim é desejar a morte muitas vezes ao dia, só porque tenho uma neurose, neurose borderline, na verdade já tentei acabar comigo e por minutos não conseguia, nada me orgulha. Também não tenho o orgulho ferido por agora lhe dizer isto mas o seu texto tocou-me.
Estou sozinha em casa e dentro de mim uma dor revolta quase me levava a pegar numa caixa de medicamentos e me esconder a choro na casa de banho, sabe Deus para fazer o quê, mas a sua crónica prendeu-me.
Tenho um blog inteiramente dedicado à minha doença www.dancas-de-mim.blogspot.com, talvez através dele encontre alguma resposta para as suas perguntas, aviso-a de antemão que são complicadas respostas para complicadas perguntas.
Deixo-lhe um texto meu, um desses acordares para a vida a que eu chamo ressuscitar:
Deito-me na escuridão, não consigo dormir sozinha, não consigo dormir sem a presença de alguém, há sombras que me perseguem, há um mundo inteiro que eu não entendo a ocupar-me as veias, nos braços as feridas que fiz a mim própria e a vontade de nunca as ter feito, cicatrizes para uma vida inteira, saltei do meu mundo para entender o vosso como se fosse fácil de entender o que cedo nos custa a amar... Fiquei assim com a linha firme a servir-me de segurança, hei-de avançar ou recuar? Esta minha súbita maneira de forjar a realidade ao ponto de me reconhecer nela. Esta minha estúpida e insensata mas tão deliciosa como desequilibrada vontade de morrer às vezes, quando todos adormecem e eu não consigo fechar as pálpebras.
Um beijo e um obrigado por me ter prendido aqui.
Margarete. És uma pessoa maravilhosa. Uma escritora que admiro. Não te meças pela doença, mede-te pelas vitórias que vais tendo sobre a neurose borderline. É pelas vitórias, pela tua escrita, pelas tuas fotos, pela tua maneira de ser que te deves medir. E, ao analisarmos estes factores, o que encontramos é que não és, de facto, normal. És extraordinária.
Além do Danças de Mim, a Margarete tem outro blogue. Aconselho uma visita atenta e diária a http://margaretedasilva.blogspot.com/ onde poderão encontrar a excelente escrita da Margarete.
Além do Danças de Mim, a Margarete tem outro blogue. Aconselho uma visita atenta e diária a http://margaretedasilva.blogspot.com/ onde poderão encontrar a excelente escrita da Margarete.
Margarete és fantástica... uma amiga, uma vencedora, uma pessoa que sente, que escreve com alma.
ResponderEliminarEste teu texto é a prova disso...
Nem sempre o caminho é fácil, mas tu tens em ti a força necessária para vencer.
Beijos
Luis
Obrigada. entre lágrimas agarro-me à vossa escrita e sinto-me viva, descobri que não é fácil tapar a tristeza e então mais vale mostrá-la e encará-la e fazer de tudo para a alterar.
ResponderEliminarMagda, estou a chorar não pelo que escrevemos ambas mas pela forma como encaras esta realidade, que infelizmente pertence a muita gente, não só minha. Tu és uma verdadeira amiga, para lá das palavras, para lá de muitos mundos, o meu mundo hoje é finalmente o vosso.
Um beijo em ti*
Estou, verdadeiramente, impressionada com este texto, com todo este post, Magda.
ResponderEliminarMargarete, que o meu silêncio seja um sinal de mim em linha recta à tua alma!
Um grande beijinho às duas, de coração***
Manuela Fonseca
Realmente fantástico como a escrita pode nos tirar de momentos penosos...és Margarete uma vencedora, pois aquele que consegue vencer a si mesmo é realmente um agraciado.
ResponderEliminarObrigado por conseguir mostrar que podemos batalha por batalha vencer o jogo.
Pérolas incandescentes de luz e inspiração para ti Stone e para Margarete.
Com carinho
Eärwen