quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Balada da neve



Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria... .
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança, e
noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...

E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza.
e cai no meu coração.

Poema de Augusto Gil

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Esperança













Foto de Vasilis Fotopoulos

Danço num palco de estrelas
Em tapete de relva macia
Que me acaricia os pés.
Ouço a música tocar
Enquanto flutuo nos teus braços
Que me envolvem
Num luar de silêncio
Fecho os olhos
Quero eternizar esta dança
Guardá-la no meu coração
E, quando o sol acordar,
Levo-te o sonho num beijo
Silencioso, terno e intenso
Com que te desperto
Para que juntos
Sonhemos o amanhã


Dueto com a Vera Silva...
(sim, eu e a Vera...)

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

À Pedra Filosofal

Foto de Simon Nekdo

Bom senso anda doente,
Cambaleia frouxo
E se deixa cair
Aos pés da insanidade.
Sorriem os astutos
E dão glória aos pecados
E à vaidade.
Mas para além das águas amargas,
Descem, penduradas em nuvens claras,
Pedras de açúcar
Enfeitadas de mil nomes
Que se lançam em carinhos,
Que rompem distâncias
E que fazem a estupidez
Corar de vergonha
E à amizade dão olhos de ampulheta,
Cantando odes à estranha alquimia
Que em nada transforma o ouro
Mas que faz nascer o realmente valioso
Nos corações feitos de chumbo.

Este poema foi-me oferecido pela Edileia, mais uma poetisa como há poucas e cujos poemas sempre me fizeram sonhar. Este poema que ela me dedicou deixou-me com lágrimas nos olhos.
Edi, obrigado. Do fundo do coração. Não me creio merecedora de tanto. Espero que a nossa amizade que está agora a nascer se mantenha por muitos e longos anos.
Conheçam mais da Edileia no blogue http://desequilibrio.blogtok.com/

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

E agora, ó Poetas, que vos deixo de mim?


Foto de Jean Vigneault


E agora, ó Poetas, que vos deixo de mim?
Longas noites de insónias
De cabelos encostados
E olhares escorregadios
Neste meu odor de jasmim

Esqueci-me de dormir
Em cima das memórias
Que fui arrastando
No destino que não apaguei...

- ah, que esquecida eu sou, Poetas!

Nas minhas mãos dorme o sono de ontem
E deslizam-me os sorrisos
Em lençóis acetinados
Manchados de lágrimas
Dos dias em que me abafei de mim

- é tudo o que me resta, Poetas!

Este poema foi escrito pela Manuela Fonseca, mais uma amiga e uma autora cuja leitura recomendo.
A Manuela mantém três blogues. No blogue
http://manuela-guardadoradesonhos.blogspot.com temos música, poesia e prosa. Pequenas coisas que a Manuela gosta e que, acima de tudo, quer partilhar com os amigos. No blogue http://ensaios-poeticos.blogspot.com temos o grato prazer de conhecer a escrita da Manuela. Uma escrita que lhe dá prazer e que a nós delicia. No blogue http://encontro-encontrodeolhares.blogspot.com podemos encontrar as noticias acerca do evento que está a ser organizado pela Manuela com a ajuda de mais três amigos.

domingo, 27 de janeiro de 2008

Em silêncio...


Foto de Daniela Guimarães


Deixa-me amar-te assim... em silêncio... Não me peças palavras que não sei pronunciar, nem gestos que nunca fiz. Não sei tanto do que queria e quero tanto do que não sei. Olhas-me e perco o norte. Fico muda e desvio o olhar. Não é por não te amar, mas sim por esse amor ser grande demais. Mas em silêncio... Seria tão fácil dizer que te amo e perder-te. Seria tão simples dançar ao som da ilusão e entregar-me completa, plácida, serena, e acrescentar apenas as letras que faltam quando não digo “Amo-te”! Não me peças para ser o que não sou, nem para me transformar subitamente em mulher, porque sou apenas menina. Queria crescer nos teus braços fortes e esconder-me atrás do teu tronco másculo. Mas abraço-te... em silêncio. Desejo o suave toque acetinado dos teus lábios nos meus e imagino como será um beijo de verdade. Anseio por ele e sonho-o... em silêncio. Aproveito-me do que tenho de melhor e sonho... Nos meus sonhos eu sou tua e tu... Tu, meu amor, pertences-me! Todos os dias nos amamos intensamente e somos apenas um do outro! Todos os segundos das minhas noites são aproveitados ao máximo e vividos energicamente, ardentemente, gloriosamente... Chega a manhã e a realidade! Não me peças palavras que não sei dizer e deixa-me! Deixa-me amar-te assim... em silêncio...


Este texto é da Vera Silva. Conheci a Vera numa livraria em Lisboa, quando fomos ao lançamento dum livro. Já nos conhecíamos virtualmente, mas ela não conhecia a minha cara. Quando soube quem eu era teve a reacção mais... inesperada. Nem vos sei explicar bem como foi ou sequer o que foi aquilo. Sei que a nossa amizade nasceu naquele momento e tem vindo a florescer a cada minuto que passa (oxalá assim continue).
Antes daquele dia já eu a acompanhava, quer no blogue
http://prosas-e-versos.blogspot.com quer no luso-poemas. Sempre atenta ao que ela escrevia porque a Vera consegue encarnar, na perfeição, o que escreve, apesar de nem sempre o sentir.

sábado, 26 de janeiro de 2008

O valor das coisas

Foto de Leo Indrawan
Fernando Pessoa dizia que “O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas sim na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”

Um dia cheguei ao luso-poemas, e encontrei esta história contada pela Tália:

“Ontem o meu filho sentiu uma vontade enorme de me oferecer algo, então apanhou uma pedra do chão a caminho de casa e ofereceu-ma… com tanto amor… e pediu-me para a guardar junto do meu coração… assim o fiz… juntei-a a outras duas que um dia me ofereceram em silêncio à beira mar…Ouro? Tenho algum guardado numa gaveta… nem sei bem em qual…”

Escolhi este texto da Tália, por ser dos mais verdadeiros e dos mais sentidos que já li. Mais tarde, se ela me autorizar, claro, trarei a este blogue outros poemas dela.
A Tália/Vanda é uma poetiza de mão cheia. Consegue retirar, das palavras, todo o sumo que elas têm e deixar-nos embriagados.
Desde que comecei a frequentar site Luso-poemas que leio tudo o que ela publica.
Conheci a Tália à uns meses atrás, e, confesso que simpatizei logo com ela. Depois, com a convivência só confirmei aquilo que já sabia. É uma pessoa amiga, que se interessa pelos outros.

Conheçam mais da Tália no blog http://www.nectardaspalavras.blogspot.com

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Alma de poeta

Foto de Claudia Marcu


Na penumbra da noite,
O suspiro de alguém que escreve...
Envolto em mistérios, sombras...
Nada encontro...
Alma que se solta...
Luz que se apaga no horizonte
Poetas que se perdem nas palavras
Ecos que o vento traz e leva...
Comunhão da tinta e do papel,
Escrevo, penso, reflicto...
Não encontro o meu destino,
Serei poeta, ou apenas uma ilusão...
Não importa,
Deixo as palavras nascer
Liberto o sentimento...
Condenado a vaguear,
Nesta dúvida e mistério que há em mim,
Sem partir, sem chegar...
Refúgio de mares envoltos em tempestades,
Paro neste porto de abrigo,
Conduzo as palavras que se soltam...
Surgem no papel,
Expressam sentimentos...
Mas quem sou?
Poeta, ou ilusão.
A dúvida persiste...
Deixo-me conduzir no momento...
Escravo de uma alma presa...
Solto, com alegria, a escrita,
Torno-me cúmplice do momento,
Textos, poemas...
Como Outonos de folhas mortas,
Folhas que caem, brisa que sopra
Quadro de inspiração...
Alimenta a alma...
Escrevo palavras soltas...
Afinal quem sou?
Poeta, ou ilusão...

Este poema foi escrito pelo Luís Ferreira que diz que não é poeta, mas, sinceramente, e na minha opinião, o que ele tem mesmo é uma Alma de Poeta. Dai a minha escolha por este poema dele.
A alma do Luís está bem espelhada no blogue que mantêm, no endereço http://marsonhos.blogspot.com, onde tenta, por meio das palavras que domina, ajudar a construir um mundo melhor. Dado que somos amigos desde que me lembro, acompanho o Mar de Sonhos desde o dia do seu nascimento. E eu, que nunca fui grande fã de poesia, acabei por ir aprendendo, com ele, a gostar e a apreciar.
Hoje o Luís tem o seu lugar garantido nos autores que eu leio, não por força da nossa amizade (que espero que dure uma eternidade), mas pela forma como escreve.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Magia de Natal



Com a chegada do mês de Dezembro, chegou também a preocupação habitual do Pai Natal. O que oferecer às crianças? Nos últimos anos o Pai Natal tinha assistido, desanimado, que muita gente se tinha esquecido do verdadeiro espírito de Natal. Cada vez mais as pessoas se preocupavam com a quantidade de prendas que recebiam em vez de se preocuparem com os outros. Partilhar, estar junto dos amigos e da família, ajudar quem mais precisasse… tudo tinha passado, agora o importante eram as prendas, prendas caras de preferência para que, no dia a seguir, pudessem mostrar aos outros.
Sem saber muito bem o que fazer, nem como chegar a quem mais precisava, falou com Rudolph, Dasher, Dancer, Prancer, Vixen, Comet, Cupid, Donder e Blitzen, as suas renas. Amigas de longa data, afinal estavam com ele desde o início, resolveram ir dar um passeio. Enquanto passeavam iam falando sobre as preocupações para aquele ano, que todos partilhavam.
Depois de caminharem por um bocado começam a ver muitas borboletas. Tinham chegado ao reino das Borboletas Mágicas.
As borboletas, por serem mágicas, perceberam logo as preocupações do pai Natal e as suas amigas renas e então chamaram os dois príncipes do reino, que chegaram numa carruagem puxada por dois cavalos – o Amor e a Ternura.
Quando chegaram ao pé do Pai Natal convidaram-no a dar um passeio pelo campo de alfazema enquanto as renas e os cavalos conversavam um pouco.
O Pai Natal falou então aos dois príncipes sobre as suas preocupações. Explicou-lhes que, cada vez mais, as pessoas queriam apenas saber de si, só olhavam para o seu umbigo, sem qualquer preocupação pelos outros. Passavam o ano a virar a cara quando viam mendigos a pedir, quando se apercebiam de crianças a passarem fome. No Natal, fingiam-se interessados, faziam apelos, havia recolha de brinquedos e de alimentos, visitas aos mais necessitados com promessas de ajudas… Com a chegada do ano novo todas essas intenções eram enterradas com o ano velho e tudo voltava ao mesmo.
Ele, Pai Natal, queria ajudar as crianças mas não conseguia, porque não sabia onde estavam todas elas.
Os príncipes, querendo ajudar, ofereceram ao Pai Natal uma bússola especial, feita de algodão doce azul.
Explicaram-lhe que aquela bússola, além de indicar o norte também mostrava onde o Pai Natal podia encontrar as crianças que, em vez de prendas, apenas queriam receber um pouco de amor e ternura.
Satisfeito por receber um presente tão útil, o Pai Natal agradeceu, porque assim teria oportunidade de ajudar ainda mais crianças.
Quando chegou ao pé das suas amigas renas o Pai Natal explicou-lhes que se tinham de apressar a chegar ao Pólo Norte porque a bússola estava com demasiadas luzes acesas e que tinham de ir buscar todos os duendes que estavam na fábrica de brinquedos para os ir deixar com cada uma daquelas crianças.
Tiveram muito trabalho, mas todo ele foi compensado por múltiplos sorrisos que nasceram na cara de cada criança. Uma épica sensação da época que o Pai Natal desejou prolongar por todo ano. Talvez um dia ofereçam essa prenda ao nosso querido Pai Natal…

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Vale a pena tentar?


Foto de Win Lassche


Um dia perguntaram-me se valia a pena tentar. Sem saber a razão ou o objecto dessa pergunta, apenas questionei: vais prejudicar, conscientemente, alguém de alguma forma? Se a resposta for um simples não, então a minha resposta à pergunta se vale a pena tentar é… que sim, definitivamente sim, seja lá o que for que se vai tentar.
Desde que nascemos a nossa vida é feita de tentativas, umas vezes dão certo, outras nem por isso. Não temos de ter medo de tentar. É através das tentativas que vamos fazendo que aprendemos. E a vida é feita de aprendizagem, da nossa aprendizagem. Não podemos aprender pelos erros dos outros, temos de aprender com os nossos. Temos de errar, de ir fazendo tentativas até acertarmos. Quando nos surge uma oportunidade pela frente se não a tentarmos seguir o que vai acontecer é que vamos ficar a perguntar, para o resto da vida, o que é poderia ter acontecido se eu a tivesse seguido? Se a seguirmos teremos a resposta a essa pergunta e ainda podemos sair beneficiados.
Nunca gostei da ideia de imaginar o que é que poderia ter acontecido. Gosto mais de pensar que fiz o que tinha de ser feito. Não me arrependo de nada do que fiz, mas antes do que não fiz, por medo de tentar. Não gosto de pensar no que poderia ter sido, prefiro pensar no que foi. Os erros que cometi foram os meus erros, aprendi com eles, cresci por causa deles.
Nunca deixamos de aprender. Nem nunca deixamos de errar... então porque haveremos de deixar de tentar?
É claro, e como disse no início. Importa que não se ponha em risco terceiras pessoas (e já agora nem nós próprios), importa respeitar os outros, aceitar e respeitar que a nossa liberdade termina onde começa a dos outros e não magoar ou prejudicar conscientemente as outras pessoas. Se estes princípios forem respeitados e se surgir alguma ideia ou alguma oportunidade... tentem.
Vale a pena tentar… Vale sempre a pena tentar ser feliz, tentar escrever… tentar amar ou ser uma mera aprendiz…
Um dia, partirei, com a consciência de que tentei…

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

À Beira Mar



Foto de Maximilian Tjipto


Enquanto mexia na areia, Lara lembrava-se daquele dia, uns anos antes, em que, numa outra praia, tinha conhecido Carlos.
Estava a apanhar uns banhos de sol com as suas amigas de ocasião, quando um grupo de rapazes sentou-se por perto, com a música a tocar.
Incomodadas, resolveram ir tomar um banho. Como a água estava fria, ficaram à beira mar a conversar até que um dos rapazes resolveu passar por elas, salpicando-as. Elas riram-se e voltaram para as toalhas.
Nos dias que se seguiram, Lara continuou a ir à praia e o mesmo rapaz também. Sentava-se sempre por perto, quando ela ia tomar banho, passava por ela e salpicava-a. Até que chegou o dia em que Carlos ganhou coragem para lhe falar. Era o último dia de férias de Lara... Trocaram telefones, moradas e prometeram manter o contacto.
Nos meses que se seguiram, Carlos e Lara escreveram-se quase todos os dias. Sobre eles, sobre os amigos, sobre a escola...
Foi por carta que o amor entre os dois começou a nascer, e foi também por carta que começaram a namorar.
Apesar da distância que os separava voltaram a encontrar-se. Nesse dia, quando se encontraram e os olhares se cruzaram, todas as dúvidas que poderiam ter dissiparam-se.
O namoro que tinha nascido por carta, tornou-se real.
Ao lembrar aquele primeiro beijo, do seu primeiro amor, Lara sorriu, por entre as lágrimas que deitava.
A distância que os separava não impediu que o namoro continuasse. Quase sempre era Carlos que ia ter ela, já que ele tinha deixado de estudar e estava à procura de emprego. Continuavam a escrever-se… era a maneira que encontravam de passar os dias quando não estavam juntos.
E foram passando os dias… os meses. Durante 2 anos Lara e Carlos namoraram, a felicidade sempre estampada no rosto dela. Carlos tratava-a sempre com carinho e ternura. Lara tinha encontrado o homem com quem queria passar o resto dos dias…
Naquele dia Lara abriu o correio e tinha uma carta. Estranhou, a letra não era conhecida, mas era para ela.
A carta, assinada por Ana, era simples. Um pedido. Para que Lara saísse da vida de Carlos porque ele namorava com a Dulce, irmã de Ana, na cidade onde viviam os três. Ana explicava ainda que a irmã não sabia do que se passava e que tinha descoberto o romance de Carlos com Lara porque o tinha seguido até à cidade onde Ana vivia.
Todas as ilusões de Lara foram destruídas. Sentia um grande amor por Carlos mas só fazia sentido se fosse correspondido, se Carlos sentisse o mesmo que ela.
Enquanto relia a carta, sentada na praia, tentava perceber como é que podia ter sido enganada daquela maneira. E chorava… chorava pelo amor perdido, pelas ilusões que tinha criado, por se sentir enganada.
Lara era determinada. Não iria deixar que Carlos percebesse o quanto a tinha magoado. Não lhe permitiria, nem por um segundo, desconfiar que ela sabia do que se passava.
Com esforço, mas resolvida a fechar este capítulo da sua vida, levantou-se, secou as lágrimas, e foi ter com Carlos que a esperava no café ao pé da estação dos comboios. Conseguiu, durante esse dia, que seria o último em que estavam juntos, fingir que estava tudo bem.
Quando se despediram combinaram novo encontro para uma semana mais tarde. Sem perder tempo, logo que Carlos se foi embora, Lara escreveu uma carta a Ana a explicar-lhe que nada sabia da vida dupla de Carlos e que iria deixá-lo. No entanto achava que, tal como ela tinha sido enganada, também Dulce estava a ser enganada, e iria ser enganada várias vezes. Propôs-lhe então dar uma lição a Carlos, para que ele percebesse que tinha sido descoberto.
No dia combinado, Carlos saiu do comboio na estação e dirigiu-se ao café onde, habitualmente, se encontrava com Lara.
Quando lá chegou encontrou Lara e Dulce, sentadas à mesma mesa. Ainda tentou explicar-se mas as duas estavam decididas. Levantaram-se e, sem se despedirem, saíram do café e da vida dele.
Cá fora, enquanto falavam sobre a situação da qual tinham saído, foi nascendo uma amizade que haveria de durar por muitos anos.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Mar


foto de Gundega Dege

Mistério amor recôndito. Mar… essa pequena palavra expressa com leviandade, quase sem noção da sua força, da sua potência exposta na nossa vida.
Casa da natura, com ondas de viagens oceânicas onde a vida acontece nos silêncios da cumplicidade dos seus habitantes diversos…
Magia… das dispersas fontes de inspiração dos azuis sobrepostos. Cores desenhadas.
Areias… que sustentam um mundo escondido em segredos protegidos e proibidos.
Respeito… que as alternâncias impõem. Que as intempéries provocam…
Deste lado, em terra firme, sempre que posso vou visitar-te para acalentar a minha saudade, para sentir a tua mensagem…
Depois, depois volto as aventuras do quotidiano mais preparado e com maior capacidade para entender a vida, sempre pronto para voltar para perto de ti!
Difícil de entender… difícil de explicar esta nossa relação desconhecida…

Este texto foi escrito por Paulo Afonso. O Paulo, além de grande amigo é também um dos autores que mais admiro.
A frase que melhor define a escrita dele é “escrevo para libertar as personagens que não consigo ser”. E saímos todos beneficiados com a escrita dele.
Escolhi este texto dele, Mar, para colocar aqui no meu blogue por duas razões. Porque fala duma paixão que partilhamos, o mar, e porque nos conhecemos os dois por causa do Mar de Sonhos.
Paulo, obrigado por me “emprestares” este Mar, e, usando uma frase também tua, que me escreveste algures no luso-poemas – quero-te! Como amigo, para sempre.
Se quiserem conhecer mais o Paulo e a escrita dele visitem o blogue -
http://poesiadepauloafonso.blogspot.com

domingo, 20 de janeiro de 2008

Os três pães

Foto de Luis Argüelles
Um dia, numa padaria, entrou um senhor, mal vestido e que se notava que passava por dificuldades, mas que, ainda assim, pediu 3 pães. O padeiro, vendo que o senhor estava a contar o seu dinheiro, na tentativa de os conseguir pagar, perguntou-lhe: Amigo, porque leva 3 pães em vez de um só?
Ao que o senhor responde: Porque um é para mim, outro para pagar um empréstimo, e o terceiro para emprestar.
O padeiro, sem perceber as razões, pediu-lhe que se explicasse. E a resposta não se fez esperar:
- Os meus pais, enquanto eu era pequeno, cuidaram de mim para que nunca passasse fome, mesmo que eles a tivessem. Hoje estão velhos, não podem trabalhar, estão doentes… um pão será para lhes pagar por tudo o que fizeram por mim. Nunca conseguirei saldar essa dívida, sem eles não seria quem sou hoje. Tenho filhos pequenos, o outro pão é para eles, para que, um dia, quando eu for mais velho e não possa cuidar de mim, eles o possam fazer, como eu faço hoje pelos meus pais.



Tal como a lenda "O Sol, a Lua e o Mar", também esta história me foi contada há muito tempo. No mundo de hoje, é importante mostrá-la a quem não a conhece, e relembrá-la a quem dela se esqueceu.

sábado, 19 de janeiro de 2008

A necessidade de escrever

Foto de Cosmin M

Todos temos necessidade de escrever… nem que seja para enviar uma carta, preencher um cheque…
Para algumas pessoas essa necessidade chega a doer, têm uma necessidade visceral, estúpida de escrever, como se disso dependesse a sua sobrevivência... necessitam da escrita como que de pão para a boca ou mesmo de respirar. São escravas das palavras, mas numa escravidão positiva, benéfica para quem escreve, benéfica para quem lê.
Esta necessidade é como uma sede. Uma sede constante que não se consegue saciar. Quem escreve nunca se sente satisfeito com o que escreveu. O poema, o conto, o texto… tem sempre alguma imperfeição, alguma coisa que poderia estar melhor. E voltam a escrever. A demanda pela perfeição continua, sempre. Como quem bebe um copo de água interminável sem conseguir saciar a sua sede.
Como se de uma droga se tratasse, a escrita vicia. Quantos de vós já pensaram em fazer uma pausa, em estar sem escrever uns tempos… mas depois não conseguem, porque se sentem mal, sem ar, com fome. A sofrer por não poderem libertar o que vos prende.
Há ainda quem escreva apenas porque gosta. Um passatempo como coleccionar selos, ir ao cinema, passear... Há quem encare a escrita como um modo de estar e não como uma necessidade ou como um vício. Escrever por escrever, apenas.
Quem escreve, seja por necessidade, vício ou porque gosta – o escritor, em suma - consegue vestir se de personagens que não são, sentir o que não sente, descrever locais que não conhece, numa ânsia apenas e só de se libertar, de partilhar.
A escrita pode revestir-se de várias capas... podem ser histórias que vivem na memória de quem as passa para o papel, poemas que começam por uma simples brincadeira, simples desabafos, respostas a uma frase que alguém disse, um pedido de desculpa, um carinho a alguém de quem gosta... Precisam apenas de ser palavras que se conjuguem, que se encontrem, se completem.
Eu gosto de ler. É essa a minha necessidade. Falta-me o ar, sofro, sinto-me presa quando não posso ler. Prosa. Poesia. Prosa poética. Preciso de ler. O meu espírito liberta-se quando leio. Vivo outras vidas, viajo, percebo outros sentimentos.
Obrigado a quem escreve por ajudarem a saciar a minha necessidade de ler.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Para lá do rosto

Foto de Jorge Luis R Tagle

Quantos de nós já tiraram conclusões acerca da maneira de ser de alguém apenas e só por olhar para o rosto?
O rosto, considerado por muitos como “espelho da alma” pode esconder a verdadeira personalidade do seu dono. Um rosto bonito, bem desenhado pode esconder uma “víbora”. Um rosto menos favorecido pode trazer-nos uma pessoa interessante, simpática e com quem dá gosto conviver.
Porque vivemos em sociedade, temos de conviver com outras pessoas. Umas com ar simpático, mas que não o são. Outras com ar antipático… e que, por sua vez, também o não são.
Hoje a nossa sociedade vive a cultura do bonito por fora. Infelizmente. O que leva a que, muita gente que merece ter lugar de destaque não o tenha por não ter recebido o bónus duma cara bonita. No oposto, muitas caras bonitas, mas que não passam disso, têm o mundo nas mãos.
Não andamos de cara tapada, claro. E a primeira coisa que vemos do outro é o rosto. E é pelo rosto que construímos a primeira opinião. Depois vem a descoberta – a personalidade corresponde ou não?
Já aprendi a não me deixar influenciar pelo rosto. Porque já vi pessoas com caras de pouco amigos que se revelaram impecáveis, com quem se pode conversar, simpáticas, amigas. Já vi pessoas chegarem com um sorriso nos lábios e esse sorriso revelou-se cínico, antipático.
Conforme vamos conhecendo as pessoas também as feições mudam. Já repararam nisso? Um rosto bonito e simpático, acompanhado duma personalidade antipática transforma-se e, aos poucos, para quem tem de conviver com essa situações, o rosto deixa de ser tão bonito, passa a ser normal e, quiçá até feio (num extremo). Noutros casos, rostos bem feios começam a ganhar beleza quando se conhece a personalidade da pessoa.
A Internet, nestas coisas pode facilitar. Ou não. Facilita porque podemos ir conhecendo a pessoa antes de lhe conhecer a cara. Talvez por isso, e para evitar ideias preconcebidas, haja quem opte por ter desenhos em vez da foto. Assim não há hipótese de se dizer que o rosto é simpático ou antipático. É a forma de ser e de estar da pessoa que vai determinar a opinião que se tem dela. E não o rosto. Do lado de lá do computador pode estar a cara mais feia do mundo. O que interessa é a personalidade… certo é que, por outro lado, a Internet facilita a criação de uma ou de várias personalidades diferentes que permitem enganos que podem ter consequências.
Mas estas falsidades não existem só na Internet. Pessoas que se fingem de amigas, que fingem que se interessam com os outros quando só querem saber de si, que ajudam com o intuito único de terem reconhecimentos públicos… E quantas vezes o que lhes vemos no rosto são sorrisos, mostram-se afáveis, são simpáticas…
Cabe-nos a nós, como indivíduos e membros da sociedade, decidir se é pelo rosto ou pela maneira de ser e de estar que avaliamos o outro. Mas não se iludam. A interacção também é importante. Comportamentos simpáticos geram simpatia. Comportamentos antipáticos geram antipatia. Por isso, sejam simpáticos…

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Momento Oportuno

Foto de Jacob Jozwiak

Era um dia como outro qualquer. De sol? Talvez, não sei.
Manuel estava na paragem do eléctrico em Lisboa a ler o jornal e a ver o tempo passar, o tempo e as pessoas, sempre observador. Tinha vindo de Castelo Branco visitar a sua irmã a Lisboa, sempre que o fazia gostava de passear na capital.
Alcide estava perdida. Queria ir com a sua madrinha a casa duma amiga, perto do Museu dos Coches mas nunca tinha vindo a Lisboa. Viu um jovem da sua idade, de bigode bem arranjado, olhos bem bonitos e com ar de quem conhecia a zona... Alcide não sabia, nem sabe, o que é ser tímida e logo vai ter com Manuel para lhe perguntar o caminho para o Museu.
Manuel, mais tímido, mas encantado com a beleza de Alcide logo lhe diz que era para lá que ia e que, se as senhoras o deixarem, terá todo o prazer de as acompanhar ao destino.
Lá foram. Alcide e Manuel, a madrinha cujo nome se perdeu no tempo…
Chegados ao destino Alcide e Manuel despediram-se com um aperto de mão, respeitoso aperto de mão, já que esta história se passa nos finais da década de 30, do século passado.
Quando Alcide e a sua madrinha entram na casa da amiga, Alcide comenta com elas que nunca tinha conhecido jovem tão encantador, tão respeitoso.
E Manuel… bem, ele não pode comentar com ninguém. Levantou apenas a ponta do bigode, num gesto que se tornaria a sua imagem e esperou… sentou-se e esperou.
Ainda dentro de casa, enquanto bebiam o chá, Alcide aproxima-se da janela e vê Manuel à espera… sem perceber muito bem de quem.
Quando acabou o lanche eram horas de voltar a casa. Alcide e a madrinha saíram de casa e, claro, Manuel lá estava, à porta. Nem a Alcide disse que o tinha visto à espera, nem Manuel disse que tinha esperado por ela.
Alcide, sempre a mesma Alcide, descarada, pergunta-lhe se ele sabe qual a melhor maneira de ir, de transportes públicos, para o Barreiro. A resposta foi rápida:
- Curioso, é mesmo para o Barreiro que vou, se as meninas me deixarem terei todo o gosto em acompanhá-las.
E acompanhou…
Acompanhou-a quando ela fugiu de casa para casar com ele, porque os pais dela não o aceitaram bem.
Acompanhou-a quando os pais dela, resignados, os aceitaram de volta para que vivessem perto.
Acompanhou-a quando ela teve a primeira filha, depois a segunda…
Acompanhou-a quando ela adoeceu a primeira vez, quando passaram por dificuldades, em que o dinheiro mal chegava para alimentar as duas filhas…
Acompanhou-a quando a vida começou a melhorar, quando as filhas casaram, quando nasceram os netos… depois os bisnetos.
Num dia de chuva, cinquenta e dois anos depois do tal dia que ninguém sabe se era de sol, Manuel deixou de acompanhar a mulher que sempre amou, a família que conhecia bem o seu bigode e aquela sua maneira especial de o levantar quando apenas podia sorrir por dentro… Deixou, como herança, a sua maneira de ser e de estar e o amor que sempre sentiu por todos

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

No tombo dum sorriso


Lembro-me, quando era mais nova (bastante mais) que andávamos na escola com um livrinho atrás para que os nossos amigos escrevessem qualquer dedicatória… chamavam-se livros de autógrafos. Na altura não queríamos os autógrafos de pessoas famosas, queríamos apenas os dos amigos, porque eram eles que mais interessavam.
Nesse livro escrevíamos uma quadra, uma frase... Interessava apenas pôr lá uma coisa qualquer e assinar. O meu livro estava cheio de quadras, frases, e evidentemente muitas assinaturas…
Uma das frases que lá estava marcou-me para sempre: “sorri sempre, ainda que o teu sorriso seja triste. Porque mais triste que o teu sorriso triste é a tristeza por não saber sorrir”. Nunca soube quem a escreveu, a original, mas sentia-a profundamente. Ainda hoje, e na verdade, assim é.
Quando estamos tristes por alguma razão, um sorriso alheio, faz-nos sentir o impulso a responder com um sorriso, e, como que por magia, as razões para essa tristeza diminuem.
E que dizer quando os filhos sorriem para os pais? São sorrisos que nos fazem sentir nas nuvens, com uma alegria imensa que só os filhos fazem os pais sentir…
Receber um sorriso das pessoas de quem gostamos, saber que estão felizes, é do melhor que o mundo tem. Para ver um sorriso no rosto das pessoas de quem gostamos movemos céu e terra. E então, sorrimos também. Porque nos sentimos realizados.
E como nada é eterno, no tombo dum sorriso, fechamos a luz da alma.
Nada... mas mesmo nada volta a ser igual até que um sorriso, verdadeiro e sentido, regresse e nos contagie.
E é no teu sorriso, no meu e no deles, que concentramos a força de viver. Vamos sorrir para percorrermos juntos o caminho da felicidade. Sorri sempre!

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

O Sol, a Lua e o Mar



Conta a lenda que o Sol e a Lua eram príncipes em reinos diferentes, cujos pais se odiavam. Quis o acaso do destino que se conhecessem e se apaixonassem. Por saberem que os pais não iam aceitar o casamento, casaram em segredo. Logo que os pais souberam de tal feito recorreram a um feiticeiro. O feiticeiro não conseguiu anular o casamento mas condenou-os a viverem, para toda a eternidade separados – o Sol reinaria de dia e a Lua à noite.

Felizmente o Mar, amigo de ambos, conseguiu, com a força da sua amizade, anular parte da condenação, permitindo ao Sol e a Lua que se encontrem, por breves instantes, no fim de cada reinado. Foi ainda, pela força da sua amizade, que se prontificou a servir de mensageiro entre o Sol e a Lua, e entre todos os amantes que estejam separados por alguma razão.


Quando eu era criança contaram-me esta linda lenda. Alves Redol contou-a no seu livro “Avieiros”. Espero que gostem dela como eu sempre gostei.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

O Nascimento

Foto de Tereza Zhafon


Vou contar uma história...

Sábado à noite, enquanto jantava, recebi um SMS da Manuela "estou no MSN, o Paulo e a Vera vem a caminho. Podes vir também para reunirmos por causa do encontro de Abril?"... Claro que sim, respondi. Logo que acabe de jantar vou ter convosco.

Nunca reuniram no Messenger? Pois, é verdade... é no MSN que estamos os 4 a preparar um encontro para Abril, do qual darei mais noticias a seu tempo.

Importa agora que a reunião de sábado foi para acertarmos o alinhamento. Passou-se do alinhamento ao blogue que foi criado para o tornar público. E foram pedidas sugestões sobre o que se havia de colocar ou não nesse espaço. Ora alguém sugeriu que nesse blogue deveriam estar os organizadores com os respectivos links para os seus blogues, assim como o nome e o respectivo blogue de quem vai colaborar. A sugestão foi aceite mas a Manuela lembra-se dum detalhe...
- "Então e a Stone? – não tem blogue, como é que a coloco?"
Pergunta alguém "e porque é que não tens blogue"
E eu respondo – porque nunca pensei em tal coisa. Não o sei fazer nem tenho tempo para o manter".
E pergunta o Paulo – "mas queres um blogue?"
E respondem a Manuela, e a Vera quase ao mesmo tempo – "sim ela quer".
Não me deram tempo de dizer nem que sim, nem que não nem que nim…
A Manuela e a Vera ofereceram-se logo para me ensinar a fazer e eu expliquei.
- "Ok, vocês ensinam-me, mas só lá para Abril que agora não tenho tempo".
E logo a Manuela e o Paulo ao mesmo tempo – "eu faço o blogue"


E pronto, deste ponto em diante acabou-se a reunião pela dita causa… e começa a reunião por causa do meu blogue... e esta heim?

Uma reunião que foi, na verdade, de rir.... Eu conto alguns detalhes... nome para o dito blogue – sugestão daqui, sugestão dali, o primeiro nome sugerido pelo Paulo foi aceite por todos, depois como esse nome estava usado, tiveram de criar outro. A seguir as dificuldades decorrentes da criação dum blogue. Quem o começou foi a Manuela, mas, já desesperada porque não estava nos seus dias com uma dor de cabeça, acabou por passar o processo criativo ao Paulo...

Logo a seguir começa a outra discussão - que modelo usar... e meus amigos, aqui também foi engraçado porque cada um de nós escolheu um modelo diferente. Creio que este foi o ponto em que o Paulo começou a perceber que estava tramado. Decidido o modelo, passamos à cor. A Manuela foi-se deitar e fiquei eu, a Vera e o Paulo. A Vera queria rosa, como o dela... eu ainda pensei num verde-claro mas o Paulo que é do Sporting ia gozar comigo o resto dos meus dias.... Hum, ainda deu tempo da Vera cair e de voltar à conversa e o tema continuava a ser a cor, o modelo.

Amigos, à uma da manhã acabei por ir dormir e confiei a criação do meu blogue ao Paulo...

Sobre o conteúdo? Não esperem encontrar nada de especial... para já só coloquei o poema (sobejamente conhecido de todos) que deu origem ao nome que uso na blogosfera. Aos poucos irei aqui colocar algumas das (poucas) coisas que tenho já publicado em dois sites. Não são tratados literários, não são o supremo da escrita... são apenas algumas coisitas. E, se os escritores que gosto e admiro autorizarem, colocarei lá também coisas deles…

E claro... aceitam-se, sempre, sugestões...

José Torres – agradeço-te o incentivo para que escreva. Timidamente lá vai acontecendo…

Manuela e Vera – obrigado pelas ideias fabulosas que foram dando ao longo da conversa e pelo apoio

Paulo – um beijo grande, bem grande pela trabalheira que tiveste este fim-de-semana. Já sei que estamos combinados que não haja obrigados...

Luís, Conceição B., Rosa Maria, Laura Gil – obrigado por todo o apoio que tem dado (ok, ok, também tínhamos combinado que não havia obrigados...)

domingo, 13 de janeiro de 2008

PEDRA FILOSOFAL













Eles não sabem que o sonho

é uma constante da vida

tão concreta e definida

como outra coisa qualquer,

como esta pedra cinzenta

em que me sento e descanso,

como este ribeiro manso

em serenos sobressaltos,

como estes pinheiros altos

que em verde e oiro se agitam,

como estas aves que gritam

em bebedeiras de azul.

eles não sabem que o sonho

é vinho, é espuma, é fermento,

bichinho álacre e sedento,

de focinho pontiagudo,

que fossa através de tudo

num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho

é tela, é cor, é pincel,

base, fuste, capitel,

arco em ogiva, vitral,

pináculo de catedral,

contraponto, sinfonia,

máscara grega, magia,

que é retorta de alquimista,

mapa do mundo distante,

rosa-dos-ventos, Infante,

caravela quinhentista,

que é cabo da Boa Esperança,

ouro, canela, marfim,

florete de espadachim,

bastidor, passo de dança,

Colombina e Arlequim,

passarola voadora,

pára-raios, locomotiva,

barco de proa festiva,

alto-forno, geradora,

cisão do átomo, radar,

ultra-som, televisão,

desembarque em foguetão

na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,

que o sonho comanda a vida,

que sempre que um homem sonha

o mundo pula e avança

como bola colorida

entre as mãos de uma criança.

In Movimento Perpétuo, 1956